Como ensino filosofia? #2 - O ensino de filosofia na escola pública de um ponto de vista privilegiado




O professor de filosofia e sua carga horária na escola pública

   Até o presente momento, a disciplina de filosofia conta com e espaço de uma aula semanal para o primeiro ano do ensino médio e duas aulas semanais para o segundo e terceiro ano. Assim, no cotidiano da escola pública é bastante difícil que um professor de filosofia consiga acompanhar todas as turmas de uma escola durante os três anos do ensino médio.

   No caso de um professor efetivo, isso depende da quantidade de alunos que atende: talvez seja possível cobrir todas as turmas de uma escola pequena, mas se o mestre pretende trabalhar por 40 hs semanais (carga cheia), será preciso complementar suas aulas em uma outra unidade escolar. Nessa outra escola, talvez não seja possível atender a todas as turmas. (Por vezes professores trabalham em três escolas para fechar sua carga horária, usando todo seu tempo para correr de uma escola a outra em horários apertados.)

  Se, ao contrário, a escola for muito grande, também é difícil que um professor de filosofia atenda a todas as turmas, pela distribuição desigual de alunos entre os períodos matutino, vespertino e noturno. Assim, o choque de horários entre as turmas muitas vezes demanda a presença de um segundo professor de filosofia na escola, contratado em caráter temporário (ACT).

  Já a condição dos professores ACTs é mais problemática. Por vezes substituindo professores de licença por apenas alguns meses e com a certeza de que a cada ano estarão em uma escola diferente, é praticamente impossível contar com o acompanhamento de uma turma durante os três anos do ensino médio. Essa instabilidade dificulta muito o aprimoramento da prática docente em sala de aula, pela incapacidade de observar os resultados de suas estratégias de ensino com a mesma turma em um prazo maior do que um ano letivo.

  Do ponto de vista dos alunos, portanto, é bastante provável que encontrem diversos professores de filosofia ao longo de sua jornada no ensino médio; cada um com seu planejamento e modo de ensinar. Fora isso, a constante mudança de professores dificulta o estabelecimento de laços que possam facilitar uma interação mais próxima, um diálogo aberto sobre si e sobre o mundo, tão necessário à construção de um pensar filosófico. O processo maiêutico de trazer à luz novas ideias, para lembrar de Sócrates, se torna mais difícil entre sujeitos que mal se conhecem.

20 horas na E.E.B Visconde – uma grande chance

 Em 2012, ao começar a trabalhar na E.E.B Visconde do Rio Branco, em Imbituba, SC percebi que me encontrava em uma posição privilegiada para o ensino da filosofia. A escola tinha o tamanho ideal para uma carga horária de 20hs, cerca de 11 turmas, mais ou menos 18 aulas semanais divididas entre os três períodos do dia. De minha parte, a intenção era a de trabalhar justamente 20 hs por semana e não mais que isso, a fim de conciliar esta ocupação com meu outro emprego, como professor de filosofia na Unisul Virtual.

Conforme comento no vídeo acima, esta situação peculiar permitiu que eu me mantivesse nestes últimos seis anos como único professor de filosofia da escola, assumindo todas as turmas do ensino médio. É este trabalho de acompanhamento destes jovens ao longo de três anos (ou mais) que tem me fornecido, não apenas parte do meu ganha pão, mas também um rico campo de estudos e reflexões sobre a prática de ensino em filosofia.

Ao reconhecer esta condição especial, ao início daquele ano de 2012 escrevi uma espécie de oração:

No ano seguinte, ao conseguir minha vaga como professor efetivo na mesma escola reservei um caderno novo para meu planejamento de aulas. Ao preencher a folha de rosto como meus dados, meio que de brincadeira escrevi no campo “curso”: doutoramento em ensino de filosofia.

 Enfim, continuo usando o mesmo caderno e procurando manter a intenção selada na oração.

Mesmo com a gradual diminuição do número de alunos na escola, e do número de aulas disponíveis para filosofia, tenho me esforçado para manter as mesmas 20 hs na escola, sem precisar complementar minha carga horária em outra unidade escolar.


    Trabalhar apenas 20 hs na escola pública me permite manter a disposição e o bom humor para continuar tentando e inovando. Com 40 hs semanais dentro da escola, mesmo que este fosse meu único emprego, eu certamente não teria o ânimo para manter esta postura. Trabalhar apenas 20hs na escola pública, entretanto, não me permite ganhar o suficiente para sustentar minha pequena família. Neste sentido, posso dizer que com meu outro emprego na Unisul, de certa forma financio este luxo de poder escolher trabalhar apenas 20hs na escola pública e manter esta ocupação também como um projeto de estudo e experimentação, o qual passo a compartilhar agora com vocês. Reconheço que a grande maioria dos professores na escola pública não podem escolher trabalhar apenas 20 hs. Assim, sou grato por isso.

Acompanhe o projeto "Como ensino filosofia?". Toda quinta um novo conteúdo :)

Comentários

  1. boa noite!
    meu amigo Dante, que projeto e esse muito bom parabens, segue em frente sempre.

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    Respostas
    1. Obrigado amigo desconhecido! Toda quinta-feira tem um novo episódio, vem coisa boa por aí!

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