Como ensino filosofia? # 12 - É preciso rir!





                
  Eu faço do riso uma ferramenta de boa convivência em minhas aulas de filosofia. Isso não implica rir de qualquer coisa a todo momento, nem rir dos outros, de forma desrespeitosa. Eu rio com os meus alunos, celebrando o fato de estarmos con-vivendo juntos a cada semana. Afinal, por que a sala de aula (na presença do professor) precisa ser um ambiente estéril ao riso?

  Conforme descrevo no vídeo, reprimir o riso pode ser um hábito irrefletido do professor em sala de aula. Talvez o façamos simplesmente por que assim fizeram conosco (#3 - ensinamos o que aprendemos), ou talvez com medo de perder a seriedade e a concentração que uma aula exige e, mais ainda, o controle em sala de aula (#4).

  É claro que faz parte do trabalho do professor manter o foco e constantemente trazer seus alunos “de volta” para o tema da aula. Mas será que isso precisa necessariamente ser feito através de censuras e repreensões? É bom lembrar que a cada “poda” de uma fala ou situação de riso em sala o professor está emitindo uma vibração adversa; um reforço negativo que se soma aos demais elementos comportamentais que vão tecendo as relações humanas naquela turma.

  Vá relembrando de seus tempos como aluno na escola… não será difícil encontrar momentos em que um gracejo de um colega levou a sala inteira a rir, menos o professor. Nesta situação, frases como “não sei qual é a graça” ou “não vejo graça nenhuma” demarcavam um nítida e paradoxal distância entre o mestre e os pupilos; um comportamento de autoexclusão do mestre em relação ao grupo, ainda que este estivesse, por dentro,… com vontade de rir também.

   Repito: é claro que há momentos em que é preciso refrear o comportamento dos alunos; situações concretas em sala de aula muitas vezes impõem ao professor este comportamento. Mas daí não se pode concluir que toda situação de riso seja um desses casos; como se o riso fosse um alerta de que as coisas não estão certas. O que me importa chamar a atenção é para uma espécie de repulsão automática ao riso dos alunos, que pode se tornar um mau hábito em nossa prática de ensino. Sem nem mesmo perceber, passamos a emitir um pulso de distanciamento a cada repreensão ou constrangimento imposto a toda forma de descontração. Deixamos assim de aproveitar tantos momentos de aproximação; deixamos inclusive de tornar nosso próprio trabalho mais leve.

   Em termos práticos, me parece que economizo muita energia dispensando-me de reprimir brincadeiras e piadas. As vezes rio junto, as vezes acrescento mais piada, as vezes simplesmente ignoro. Percebo que o simples fato de não emitir um sinal de reprovação diante de uma brincadeira ou piada já me ajuda a estabelecer uma relação de companheirismo. E é este companheirismo que me ajuda muitas vezes a conseguir o silêncio da sala no momentos em que preciso dele. Muitos alunos reconhecem intuitivamente que "me devem" a atenção justamente por eu não estar, a cada momento, exigindo desnecessariamente o silêncio e a atenção.

  Aprendi também que é possível “ir e voltar” de um brincadeira sem perder a direção da aula; basta que se saiba onde se está indo para retomar oportunamente ao conteúdo. É preciso saber abrir e fechar parênteses no ritmo do discurso oral.

  Particularmente, não sou muito de contar piadas propriamente ditas. Meu estilo vai mais na direção de uma peça de stand up, ou seja uma fala prolongada que faz rir a partir de diferentes elementos. Todavia, não se trata de um monólogo, mas de uma fala que vai incorporando também as contribuições dos alunos. Neste sentido, o que faz rir em minhas aulas é uma mescla das brincadeiras e gracejos que surgem da simples interação humana aliada à própria exposição dos conteúdos, na medida em que vou conseguindo inserir curiosidades, exemplos hilários, perguntas inusitadas, ou contando anedotas filosóficas adaptadas à linguagem dos alunos (#11 sobre contar uma história). Talvez até possamos chamar isso de stand up phylosophy!


Acompanhe o projeto "Como ensino filosofia?". Toda quinta um novo conteúdo :)

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Sociedade disciplinar e sociedade de controle

Série Boas práticas- Filosofia na Idade Média 2020b

PASSEIO VIRTUAL PELA EXPOSIÇÃO: DEUSES GREGOS - COLEÇÃO DO MUSEU PERGAMON DE BERLIM - FAAP 2006.